sexta-feira, 21 de setembro de 2012


                    O CANTO DOS POETAS


                      A Poetisa do Sado

                                          
Mariana Angélica de Andrade nasceu em Casa Branca, Sousel, em 11 de Maio de 1840. Era filha de Joaquim António Serrano, poeta, escritor e jornalista do Diário de Notícias e de Francisca Pereira da Silva. Aos 4 anos veio para Setúbal, onde vivia a sua madrinha que a criou e educou. Mariana adoptou de sua madrinha Gertrudes Angélica d’ Andrade os apelidos que usava. Provavelmente, viveu na Rua Nova da Conceição (actual Av. 5 de Outubro), no nº 21.
         Não existem rastos sobre a aprendizagem escolar da poetisa. Contudo, dada a situação do sistema educativo português da altura – 1846-1850 – é natural que Mariana tenha frequentado o ensino privado ou tenha tido uma preceptora, solução que as famílias mais abastadas encontravam para dar alguma instrução às suas filhas. A madrinha de Mariana fazia parte das famílias burguesas da cidade, já que era viúva de um rico proprietário, e foi umas das pessoas que mais contribuiu para a existência e manutenção do Asilo da Infância Desvalida de Setúbal.
       Casou civilmente em 1874 com o escritor, filólogo e poeta António Cândido de Figueiredo com o qual se correspondera durante anos e que estimulou a sua actividade poética. Foi desta troca de correspondência que o amor nasceu entre eles, sendo Cândido de Figueiredo ainda estudante em Coimbra. Depois do casamento foi viver para Lisboa, na Calçada do Duque 13-2º. Teve duas filhas – Rosalinda e Corina. Estas tinham, respectivamente, 7 e 5 anos quando Mariana Angélica faleceu às 3 horas da madrugada, em 14 de Novembro de 1882, aos 42 anos, vítima de tuberculose pulmonar. Foi enterrada no dia 16 de Novembro, às 11 horas da manhã, no Cemitério Ocidental, hoje Cemitério dos Prazeres.
       A morte de Mariana foi noticiada na Gazeta Setubalense, no Diário de Notícias, no Século, no Jornal do Comércio, no Distrito de Viseu, no Jornal Ilustrado, no Jornal da Noite, no Viriato, no Diário de Portugal, no Comércio Português e em outros jornais e revistas onde a poetisa colaborou o que demonstra a consideração, o apreço e a admiração pela mesma.
         O Distrito de Viseu noticiou deste modo a sua morte:
«Era uma senhora muito instruída e prendada. Os formosos versos que publicou em vários jornais deram-lhe o cognome de «A Poetisa do Sado».
        Admiravam a sua obra nomes consagrados na literatura da época, como António Xavier Cordeiro, Gonçalves Crespo, Júlio César Machado, Feliciano Castilho, João Penha Alberto Pimentel, Simões Dias e Gomes de Amorim.
        Mariana Angélica foi uma pessoa culta, conhecedora de Camões, Filinto Elísio, Nicolau Tolentino, Marquesa de Alorna, Publia de Castro, Bocage, Almeida Garrett, Feliciano de Castilho, Alexandre Herculano, Soares dos Passos, Camilo C. Branco, João de Deus, Gomes de Amorim e Simões Dias, Ana Plácido, entre outros. Também conhecia Molière, Victor Hugo e outros autores estrangeiros dos quais traduziu, para português, romances que foram publicados em folhetins em alguns dos jornais e revistas onde colaborou.
       Um dos aspectos que a preocupava era a Educação em geral e a das mulheres em particular, tendo abordado este assunto por várias vezes nas publicações onde colaborava e que foram transcritos por outras publicações da época.
          Tratou temas relacionados com problemas políticos e sociais do seu tempo em muitos dos seus poemas – a guerra, a injustiça, a pobreza, a liberdade – que foram recitados em várias ocasiões, em festas e recitais em Setúbal.Verifica-se na obra poética a sua revolta, a sua insatisfação, a sua mágoa com o facto de ser mulher.
Mariana Angélica d’Andrade começou a escrever muito cedo poesia; o poema “Estações da Vida”, publicado no seu primeiro livro, Murmúrios do Sado, tem a data de 1854.   
A sua primeira obra, Murmúrios do Sado, foi publicada em 1870, em Setúbal, e prefaciada por Cândido de Figueiredo. Esta obra mereceu a atenção do Grémio Literário do Brasil tendo sido lavrado à autora diploma de sócia honorária.
A obra Revérberos do Poente foi publicada postumamente em 1883, no Porto, com prefácio de Gomes de Amorim. Também As Rimas Selectas foram publicadas postumamente em 1917, por Nuno Catarino Cardoso, na antologia Poetisas Portuguesas.
Mariana Andrade também escreveu artigos de opinião e de crítica, contos, fantasias e duas comédias; alguns que estão publicados, outros que deixou inéditos. A comédia As Esporas do Alferes foi estreada em Setúbal em 1870 e representada pelo actor José Romano.
Foi redactora da Gazeta Setubalense e da Grinalda Literária, colaborou no jornal Aspirações, na Voz Feminina (1868-1869), Almanaque de Senhoras (1871), Almanaque de Lembranças (1867) e em periódicos de Lisboa (Gazeta das Salas, 1877), Coimbra e Porto.

                                                                 Anita Vilar


     POESIA E MULHER

                                         Celeste dom da poesia,
                                                       Jóia sem preço, calcada
                                                       Aos pés da turba, que insulta
                                                       As desventuras do génio.

                                                                     Camilo Castelo Branco
   
                           Porque me vens tu arcanjo da poesia,
 Com teu estro de brilho cintilante,
 Com fogo divinal que a fronte queima,
                          Esta alma extasiar?!

Eu sinto-me inspirada!... mas o mundo
Maldiz os sons da lira, afronta o génio
Que procura elevar-se, em asas de oiro,
                          Acima do vulgar!

Com loucos preconceitos ouve os hinos,
- Hinos que não conhece e não entende;-
Vozes d’alma sinceras que condena
                          Por não as compreender!

E mais a escarnece quando sabe
Que vêm d’uma mulher os sons que escuta!
Á vítima inocente nem lhe é dado
                          Prantos deixar correr!

Só pode ser feliz, ou ser querida,
A mulher que em salões pompeia galas,
Os gestos, a maneira, e em mil requebros
                           Sorri-se ternamente!

Que em vasto coração, se o tem acaso,
A muitos pretendentes presta asilo…
E o falso amor que se desata em risos,
                           Reparte largamente!

Mas se odeia a vaidade mentirosa,
Mira outra luz, tem outra senda aberta:
Precisa doutro amor, quer outro brilho
                           Que não há nos salões!

Ama a luz radiante do talento,
Idolatra a poesia, abraça a lira,
E sonha melhor mundo, embora este
                            Lhe roube as ilusões!...

Poesia! Se dás glória eu não a gozo;
Se dás palmas a quem a vida enturvas,
São elas tão exíguas que não chegam
                            A mim pobre mulher!


Que importa!... Se não cinjo verdes louros
Nem possuo os troféus que dás a custo,
Cânticos são riqueza de minha alma,
                             Nem outra glória quer.

Eu sinto-me enlevada quando penso
Em ti, meu terno amor, meu doce encanto.
O mundo que me veja e tenha zelos
                             Desta funda paixão!

Seus risos insensatos não me afligem;
Mas se ele me partisse a pobre lira…
Ai de mim!... também ele aniquilava
                           Meu triste coração!



                                        MISTÉRIOS DO TOUCADOR 

                   

                   Cassilda foi ao baile, e tão formosa
                   Que fez inveja a todas as senhoras;
                   Muito embora gentis, encantadoras,
                   Nenhuma era tão bela e majestosa.

                   Tinha a cútis rosada e cetinosa
                             Tinha no olhar o brilho das auroras,
Tinha as formas perfeitas, sedutoras;
 E ela passava altiva e donairosa.

 De valsas e sorrisos fatigada,
 Assim falou depois com a criada
          A sós, ao toucador vendo as feições:
     
 « Fui rainha do baile! Que patetas
 São os homens!... Recolhe nas gavetas
 Os dentes, o cabelo, os algodões…»





                  SETÚBAL ANTIGA



    OS NOSSOS POETAS


     BANCO DE JARDIM

Sou um banco de jardim
Tão simples que ninguém repara em mim
Estou um pouco esfolado, é certo
E até um pouco encoberto
Mas o que vi e ouvi,
Desde que estou aqui
É tão forte em emoção
Que preciso de partilhar
O que trago no coração
São muitos risos e galhofas
De meninos turbulentos
São muitos gritos e zangas
De adultos quezilentos
E eu sempre calado!
Assisti ao primeiro beijo
De um par apaixonado
E quando anos mais tarde
Ele a pediu em casamento
Estavam mesmo ao meu lado.
Como me lembro desse momento!
Ouço os relatos do futebol,
As queixas dos mal-amados
Confidências de vizinhas
E segredos mal guardados
Há dias fiquei preocupado
Um jovem com ar doente
Sentou-se com uma seringa ao lado
E sem motivo aparente
Delirou, delirou, delirou
E eu ali a ver
Sem nada poder fazer
Ontem uma velhinha,
Que se sentou a descansar
Tirou da sua bolsinha
Meia dúzia de moedas
E começou a suspirar
Eu sofro com estes problemas
E penso cá para mim
Que posso eu fazer
Se sou apenas
Um simples banco de jardim?


Ivone Vilares



            BOCAGE

Bocage, o grande poeta,
Em Setúbal nasceu;
Esse príncipe das letras,
Que em Lisboa faleceu!

A rua que o viu nascer,
Foi Edmond Bartissol,
Dando-lhe a honra de ver
A primeira vez o sol!

Foi a 15 de Setembro,
De 1765, nascido;
E aos 21 de Dezembro
De 1805, falecido!

Manuel Maria Barbosa
Du Bocage; foi registado,
Mas por Elmano Sadino,
Na Nova Arcádia, apelidado!

Esse vate laureado,
Em poesia nunca vencido,
Foi poeta iluminado,
Um satírico esclarecido!

Era oficial marinheiro,
E apesar de pai juiz,
No Santo Ofício e Limoeiro
Teve preso o infeliz!

Sem motivo nem razão,
Nos cárceres foi encerrado,
Mais tarde saiu da prisão,
Do que não fez, perdoado!

Deixou uma obra perfeita
Da mais picante à lírica,
E até esbanjou talento
Em espirituosa satírica!

Eram de rara perfeição
Os seus dotes de sonetista,
Como lesto na intervenção,
Foi um nato repentista!

Deixou-nos obras-primas,
Escrita Maravilhosa,
“Obras completas e Rimas,”
De satírica espirituosa!

O nosso Bocage deixou
Nome ilustre na História,
O povo lhe levantou,
Em honra uma Memória!

Bocage, tu és lembrado,
Por toda a humanidade,
És o “Príncipe Coroado”
Desta bela e nobre Cidade!

                    Luís Francisco Chainho 




     REALISMO

As mensagens de amor
Para gente sem grandeza
Informam o predador
Que ali está mais uma presa.

A História está aí
A dizer-nos que a brandura
É sumo de abacaxi
Que refresca a ditadura.

Os violentos até pagam
Aos mestres em letargia
Para que humildes tragam
Os utentes da coxia.

Nenhum monstro abdica
Da sua monstruosidade
Só porque a presa estica
A sua docilidade.

O primeiro acto do Bem
É combater contra o Mal
E não prostrar o refém
Com cânticos de Natal.

Teorias há aos montes,
Só que a realidade
Mostra que os brutamontes
São os donos da Cidade!

             Francisco Pratas



SENDO DIFERENTES, MAS IGUAIS!

O mundo, um dia achar sabedoria,
Quando então souber compreender,
Nesta vida tudo muda e varia,
Todos os dias estamos a aprender!
  
Na verdade, parecemos todos iguais,
Mas nesta parecença; somos diferentes,
Conquanto há os que se parecem mais,
Pensando até serem os mais inteligentes!

Mas tal como os frutos e as flores,
Que nos podem mais atrair e agradar,
Sendo variadas e lindas suas cores,
Por serem diferentes têm variar!

Assim acontece com a humanidade,
Distinguindo-se pela cor da pele ou raça!
Diferentes, mas sem haver desigualdade,
Atendendo à sua condição de sua graça!
  
 As pessoas, sendo seres especiais,
Seres únicos no conceito da criação,
Será impossível encontra dois iguais,
Aos diferentes daremos mais dedicação!
  
 É nessa desigualdade encontrada,
Que pomos à prova o nosso carinho,
 À humanidade deve ser apresentada,
A obra desenvolvida neste cantinho!

                                                    J. Rodrigues



        OS LIVROS DOS AMIGOS

                       MARIA HELENA






















                                            ACREDITA

          A poesia não nasce dum mito
          tão pouco dum sonho
          tão pouco dum grito.
          Poesia nasceu
          num gesto de dádiva
          nasceu aqui no gesto aberto da minha mão.

                            FAZ ISSO

          Se ao leres meus versos
          conseguires cantar
          canta.
          É fácil o meu poema!
          é como fechar os lábios
          em gesto mimado.
          Se souberes rezar
          reza.
          Une os braços e aperta os laços
          das rosas que caem pelo teu 
          regaço
          Nisso se resumem as palavras
          que não escrevi, as que senti
          no suave encanto
          do que já sonhei
          e não vivi.



OS NOSSOS CONTOS

                        O PEQUENO MALMEQUER

Havia em pequeno malmequer muito pequenino com muitas flores com os olhitos amarelos que vivia num lindo jardim à beira da estrada já perto do bosque dos rouxinóis, onde havia muitas, muitas formigas que tinham o seu formigueiro debaixo do tronco de uma árvore já envelhecida e que andavam muito irrequietas e atarefadas a encher o seu celeiro porque o Inverno se aproximava, ia chover e já não podiam sair de casa.
Uma delas era muito vaidosa e dizia que conseguia carregar sementes muito grandes, maiores e mais pesadas que o seu próprio corpo, e dizia que era ela quem carregava mais para o celeiro.
No meio de tantas centenas destes insectozinhos, eu conhecia bem a laboriosa formiga, que de tão atarefada que andava, muitas vezes nem me dava os bons dias.
Até me parecia uma formiga maior que as outras, talvez por ser fêmea, pois os machos são menores.
Um dia trouxe uma semente de girassol, mas na entrada do formigueiro, depois de renhida luta, veio o cansaço e o desespero! Depois o desalento e por fim a desistência.
A enorme semente não coube na entrada e teve que ficar ali dias e dias, até que a chuva chegou e enterrou a semente na terra arenosa que circundava a entrada do seu celeiro. Depois voltou a chover e a semente germinou, cresceu, cresceu, apanhou mais umas chuvadas na Primavera e ficou enorme.
Estava já uma linda planta, com mais de um metro de altura e cheia de grossas folhas verdes e com muitos botões de flores que brevemente iriam abrir!
E assim foi, eu até me sentia pequenino ao pé dela e também me preocupava com as flores enormes que iriam deixar tristes os meus malmequerzinhos também prestes a abrir.
Chegou o Verão, e era vê-los girar com o sol, todos abertos, gigantes malmequeres amarelos doiro, sorrindo para o sol.
Um dia um lenhador passou por ali e comentou: - Como veio nascer aqui afastado do jardim este girassol tão grande e com tantas flores? ! ....
Os meses foram passando, as pétalas caindo e uns enormes círculos acastanhados ficaram com tantas sementes que logo os pássaros começaram a comer e aquele espaço se tornou muito animado e muito visitado pelas mais variadas aves.
Na sua correria de sempre as formigas nem se apercebiam da festa que havia por cima do seu formigueiro. Mas ainda sobraram muitas sementes que foram caindo para o chão e foram nascendo e crescendo desordenadamente, formando um lindo jardim de girassóis no ano seguinte.
O velho tronco de árvore ficou todo coberto de flores amarelas e em cada ano que passa.
O jardim dos girassóis está mais bonito e maior e a nossa amiga formiga que carregava as sementes grandes, desta vez, em vez de encher mais o seu celeiro semeou um gigantesco jardim de amarelos girassóis.

                                                                    Maria Dores Amado


                 NOTÍCIAS CULTURAIS



      Decorre amanhã o almoço-convívio com "momentos de poesia" que

  consta do nosso plano de actividades. Lembramos que a concentração

  se faz junto ao Estádio do Bonfim (lado do jardim) pelas 9.30



      O nosso sócio e colaborador  Inácio Lagarto  informou-nos de que 

  tem um blogue poético. O endereço é http://otragal.blogspot.com
  
       

      Realiza-se em Lisboa, de 26 a 29 do corrente mês, o 56º Congresso

 da UMEM (União Mundial de Escritores Médicos), este ano organizado

pela SOPEAM (Sociedade Portuguesa de Escritores e Artistas Médicos).

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